O combustível tem se tornado artigo de luxo. As sucessivas altas dos preços nos últimos meses obrigam o brasileiro a fazer contas na hora de mandar encher o tanque. No Distrito Federal, o litro da gasolina é encontrado a R$ 4,27, em média. No entanto, esse salgado valor é 175% mais caro do que quando o derivado do petróleo sai da refinaria, a R$ 1,55. Ou seja, quase três vezes mais – e poucos motoristas sabem disso.
Quem depende de carro não deve ter alento tão cedo, pois a partir deste sábado (24/2) haverá novo reajuste para os distribuidores. Eles devem comprar o insumo da Petrobras a R$ 1,56. Resta saber qual será o impacto para o consumidor final.
Desde o dia 19 de fevereiro, a Petrobras decidiu tornar públicas tais informações, que agora podem ser encontradas no site da empresa. Na página virtual, também é possível descobrir todos os insumos usados na fabricação da gasolina, bem como entender quais tributos elevam tanto o valor do combustível.
As planilhas disponíveis mostram que os impostos são os maiores responsáveis por manter o produto a cifras assustadoras. Cerca de 45% do valor final da gasolina são referentes a encargos, sendo 29% deles estaduais – a exemplo do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) – e 16% federais – como Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico (Cide), PIS/Pasep e Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins).
Ainda figuram como vilões, no preço final da gasolina, 27% em realização da Petrobras – que é o preço definido pela estatal, sem impostos ou tributação –, 13% do etanol anidro (substância misturada ao combustível) e 15% em distribuição e revenda. Trocando em miúdos, todo esse processo é pago pelo consumidor.
“Temos um problema grave no país: a existência de apenas um produtor, a Petrobras. Não há concorrência, e ela coloca o preço que quiser. Além disso, o posto estabelece a margem de lucro dele. Isso somado aos impostos estaduais e federais”, explica o professor de economia da UnB e economista-chefe do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), Vítor Gomes.
Mudança de comportamento
A variação no preço da gasolina provocou mudanças no comportamento dos brasilienses. Se antes as idas aos postos eram menos frequentes e o tanque saía cheio, agora há quem escolha abastecer “a conta-gotas”. A estratégia dos condutores tem dois propósitos: ver o valor do combustível cair nos próximos dias ou encontrar promoções pelo caminho.
O administrador Giuliano Morelli, 46 anos, questiona o alto valor praticado nos postos. “Comparando-os com os de outros países – e posso falar isso, pois já morei fora –, os impostos cobrados pela gasolina no Brasil são muito superiores. Acaba sobrando tudo para o consumidor”, reclama.
Pedro de Andrade, 25, é supervisor de segurança e diz não conseguir mais abastecer sua moto regularmente, por causa do custo elevado. “Tenho andado menos de moto. A gasolina aumenta, mas nosso salário não”, lamenta.
Alta tributação
O Sindicato do Comércio Varejista de Combustíveis e de Lubrificantes do Distrito Federal (Sindicombustíveis-DF) atribui os preços exorbitantes nas bombas à alta carga tributária praticada no país. “O valor de impostos sobre combustíveis representa a maior tributação existente em todo o país. É importante lembrar que as distribuidoras que compram o produto ainda precisam fazer a adição de outros itens para que a gasolina fique própria para consumo. Isso também tem um custo”, defende Daniel Costa, presidente do órgão.
No caso dos donos de postos, segundo o sindicato, os valores são justificados por despesas como o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) e os salários dos funcionários, além do preço pago junto às distribuidoras. “Em média, o custo pago ao distribuidor por litro de gasolina é de R$ 3,91. Como um dono de posto de combustível pode arcar com esse valor e vender mais barato?”, questiona.
Liberdade de preços
Em nota, a Agência Nacional do Petróleo (ANP) informou que desde janeiro de 2002 vigora no país o regime de liberdade de preços em toda a cadeia de produção, distribuição e revenda de combustíveis e derivados do petróleo.
“Assim, não há qualquer tipo de tabelamento de preços, nem fixação de valores máximos e mínimos ou exigência de autorização oficial prévia para reajustes de preços dos combustíveis em qualquer etapa da comercialização.”
O órgão também ressaltou realizar pesquisa semanal dos preços praticados por revendedores e postos de combustíveis de todo o país, com o objetivo de contribuir para que os consumidores busquem as melhores opções de compra e a fim de permitir a identificação de infrações à ordem econômica.
“Caso sejam identificadas ocorrências como cartéis ou preços predatórios, que consistam na redução do preço abaixo do custo do produto para eliminação da concorrência, a ANP comunica ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE/Ministério da Justiça) para a adoção das medidas cabíveis”.
Gás de cozinha
Não é apenas a gasolina que chega ao consumidor final com preço nas alturas. O gás liquefeito de petróleo (GLP), o popular gás de cozinha, é vendido aos distribuidores por R$ 23,16, em média, mas quem compra um botijão nos tradicionais pontos de venda paga R$ 70,21. As informações constam no site da ANP, em levantamento feito entre 11 e 17 de fevereiro deste ano.
Assim como a gasolina, o preço do gás de cozinha também é composto por vários itens. São eles: realização da Petrobras (35%), ICMS (17%), PIS/Pasep e Confins (3%) e distribuição e revenda (45%). O presidente do Sindicato dos Trabalhadores no Comércio de Minérios e Derivados de Petróleo no Distrito Federal, Raimundo Miquilino da Cunha, ataca a política de preços dos distribuidores e pede um rigor maior na fiscalização.
“Virou caso de polícia, não existe diálogo. Não se sabe nem se os botijões estão sendo repassados com os 13kg exigidos pela ANP. O que existe é um grande desinteresse por parte dos órgãos que deveriam fiscalizar e regular a situação”, relata.
Na opinião do presidente do Sindicato dos Economistas do DF, Flauzino Antunes Neto, os impostos contribuem substancialmente para a elevação dos preços, mas não podem ser apontados como únicos fatores. “O preço da gasolina sobe por conta de vários fatores, como os cartéis, importação, variação do dólar, margem de lucro das distribuidoras e donos de postos”, explica Flauzino.
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