O Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) alterou o regimento interno para permitir a indenização de férias não gozadas por juízes e desembargadores. No dia 27 de janeiro deste ano, os desembargadores do TJ aprovaram a alteração da redação inciso 1º do artigo 2 da Resolução 13 de agosto de 2013.
O novo texto dispõe que é “assegurado ao magistrado que, por necessidade do serviço, não obtiver a concessão de férias e acumular mais de dois períodos, a conversão em pecúnia, mediante requerimento, respeitada a disponibilidade orçamentária”. Cada juiz, segundo o texto, “poderá requerer, anualmente, a conversão em pecúnia de até 60 (sessenta) dias de férias não usufruídas”.
Porém, alguns servidores demonstraram insatisfação com a possibilidade de conversão em pecúnia de férias não usufruídas. Isso porque alegam que o TJ-BA deve passivos de mais de dez anos, e a Corte baiana diz que não tem dinheiro para pagar. Alguns servidores teriam direito a receber entre R$ 40 mil e R$ 100 mil, mas não receberam nem 10% do valor por falta de recurso. O descontentamento é que, a cada ano, conforme diz a categoria, o TJ paga R$ 60 mil ao magistrado de um valor discricionário, que é a compra de férias. Questionam como o TJ não tem recurso para pagar o passivo antigo e reconhecido, mas tem recurso para pagar discricionariamente as férias. Outra queixa é que, boa parte dos recursos que os servidores têm a receber são pagos como precatórios, através de decisão judicial transitada em julgado, enquanto os magistrados receberiam através de requerimentos administrativos. Ainda reclamam que os servidores atualmente estão impedidos de vender 10 dias de férias.
Ao Bahia Notícias, o coordenador de comunicação e imprensa do Sindicato dos Servidores dos Servicos Auxiliares do Poder Judiciario do Estado da Bahia (Sintaj), Alberto Miranda, reclamou exatamente sobre esse tratamento diferenciado. "Nós antigamente tínhamos essa possibilidade de venda de férias e hoje só quem tem essa prorrogativa são os magistrados. A gente sempre se pauta pelo princípio da isonomia. Se os magistrados têm, nós servidores também deveríamos ter esse direito". "O Judiciário é um só, o orçamento é o mesmo, a verba para o pagamento de indenização é a mesma", completou.
Ele ainda apontou que este não é o momento ideal de se falar nesse tipo de pagamento. "A gente acha que pagamento de qualquer tipo de indenização em um momento como esse... deveria se aguardar um pouco mais, porque estamos numa pandemia".
Miranda deixou claro, porém, que o sindicato só é contra o pagamento antecipado de férias, e não o de férias não usufruídas. "Uma coisa é pagar o benefício que é de direito, de algo que não foi usufruído, como é o caso dessa resolução. Mas adiantar férias vincendas, a gente é completamente contra".
A presidente da Associação de Magistrados da Bahia (Amab), Nartir Weber, é firme ao dizer que todos os benefícios que os juízes recebem estão amparados em resoluções do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Ela recorda que a Resolução 25 do CNJ, editada em 2006, previu a possibilidade da conversão das férias em pecúnia. Outra resolução é a 293, que garante a venda de 1/3 das férias. “Nós não criamos nada. É tudo baseado no CNJ”, frisa. Nartir afirma que o recebimento desses valores, muitas vezes, acontece quando o juiz se aposenta.
Weber pontua ainda que, na Bahia, são 150 comarcas vagas, sendo 107 comarcas e 43 varas sem juízes, e por isso, muitas vezes, os juízes precisam atuar em dois locais. Ela desmistifica que juízes conseguem tirar férias de 60 dias todos os anos. “Muitos juízes não tiram férias direito. Há uma grande carência de magistrados. Respondemos por mais de uma unidade judicial no geral. A minha unidade titular pode estar tranquila, mas a outra que substituo não, e pela cumulação de cargos, nós somos obrigados a permanecer trabalhando. Se o trabalho exigir que o juiz permaneça em atividade, as férias podem ser convertidas em pecúnia”, explica a presidente da Amab.
A representante dos magistrados também alerta que o “CNJ não quer mais que a gente fique sem tirar férias”. “O CNJ não quer mais esta situação, pois teve casos de férias não usufruídas que chegaram até R$ 1 milhão. Mas ele quer que a gente tire férias na medida do possível”. Ela frisa que nem sempre o juiz pode tirar férias por ser da área eleitoral e estar em período de eleições, por exemplo. “E defendemos que os juízes tirem férias até mesmo para o bem da saúde mental”, pontua.
Em agosto de 2020, o então presidente do CNJ, ministro Dias Toffoli, decidiu que os tribunais deveriam cumprir a Resolução 293 e comprar 1/3 das férias de juízes no período da pandemia. O questionamento havia sido feito pela Associação dos Juízes Federais (Ajufe) sobre o direito de conversão de 10 dias de férias relativos ao primeiro semestre de 2020, devido ao trabalho realizado pela classe no julgamento de ações de auxílio-emergencial e benefícios previdenciários.
POLÊMICA TAMBÉM NO MP-BA
A venda de férias no Judiciário já foi alvo de polêmica no início deste ano, mas em outro órgão: no Ministério Público da Bahia (MP-BA). O site The Intercept noticiou que a então procuradora-geral de Justiça, Ediene Lousado, assinou um ato que permite uma renda extra de até R$ 120 mil para quem vende férias ou licenças, com custo de aproximadamente R$ 100 milhões para os cofres públicos desde 2017. Após a matéria, o Sindicato dos Servidores do Ministério Público da Bahia (Sindsemp) pediu à Procuradoria de Geral de Justiça (PGJ) que revogue os atos que permitem aos promotores e procuradores de Justiça vender todos os dias de férias e as licenças prêmios.
Na época, o argumento dado pela Associação dos Membros do Ministério Público da Bahia (Ampeb) foi parecido com o da Amab. A instituição declarou que em razão da deficiência no quadro de promotores e procuradores na Bahia, com quase 200 vagas sem preenchimento, é de interesse da administração comprar as férias e licenças para evitar comprometimento das atividades com afastamentos de membros do Parquet. Informações por Bahia Notícias