As investigações da Operação Trickster, da Polícia Civil, que apura um esquema criminoso no qual R$ 1 bilhão teria sido desviado do sistema de bilhetagem eletrônica do Distrito Federal, terão novos desdobramentos em breve. O volume de provas apreendidas nas primeiras fases do trabalho resultaram na abertura de seis novos inquéritos. Um deles apura a localização de malotes com dinheiro escondidos no teto de um dos terminais do BRT. Outro envolve o suposto pagamento de propina ao ex-diretor de controle de bilhetagem automática do DFTrans, Harumy Tomonori Honda, preso na segunda fase da operação.
Na próxima terça-feira (24/7), três servidores do DFTrans prestarão depoimento na Coordenação de Repressão aos Crimes Contra o Consumidor, a Propriedade Imaterial e a Fraudes (Corf) sobre a história dos malotes com dinheiro. O montante seria proveniente da bilhetagem eletrônica. Os investigadores querem saber o motivo pelo qual o dinheiro estava escondido no forro do teto e onde foi parar.
Ouvido na delegacia, em maio de 2018, um ex-funcionário terceirizado da autarquia afirmou aos policiais ter encontrado malotes com dinheiro escondido em um buraco no teto da estação do BRT no Park Way. A descoberta ocorreu em 1º de abril de 2016, mas só veio à tona em maio deste ano, após o depoimento (transcrito abaixo).
Depoimento da testemunha da operação Trickster by Metropoles on Scribd
O ex-funcionário da autarquia relatou, ainda, que não foi aberto qualquer tipo de processo administrativo para apurar a origem do dinheiro. Segundo ele, houve um roubo no terminal, curiosamente, no mesmo dia da descoberta dos malotes: a porta do local foi arrombada com a ajuda de um maçarico. Embora o caso tenha sido registrado na 11ª Delegacia de Polícia (Núcleo Bandeirante), ninguém foi preso.Transporte de malotes
De acordo com o termo de declaração à polícia, o ex-funcionário contou ter notado o buraco no teto quando chegou ao terminal e decidiu checar o que havia ali. Após colocar a mão no espaço aberto, ele diz ter puxado um dos malotes onde havia dinheiro. Em seguida, retirou outros três volumes do buraco. A testemunha relatou ter pedido ajuda a outros servidores para contar o dinheiro e, depois, acionado uma empresa especializada no transporte de valores para levar os recursos até o DFTrans.
Uma semana após o assalto, a testemunha foi demitida pelo DFTrans – acrescentou ela no depoimento à equipe da Corf. No inquérito, consta a afirmação de que o funcionário teria, em 2017, começado a presenciar uma série de irregularidades na autarquia, como a glosa de pagamentos indevidos. Ele produzia relatórios com os extratos dos cartões utilizados (foto abaixo) e os encaminhava para análise da chefia.
Pagamento de propina
O outro inquérito apurado pela Corf diz respeito a um suposto pagamento de propina, flagrado em vídeo. Os investigadores estão em poder de imagens gravadas por câmeras de segurança da Cooperbras. O vídeo mostra o ex-responsável pela unidade de controle de bilhetagem automática do DFTrans – Harumy Tomonori Honda – deixando a pé a garagem da permissionária. Nos mãos do ex-gestor, havia um envelope, cujo conteúdo, pelo volume, os investigadores acreditam se tratar de dinheiro.
O flagrante foi feito em meados de abril de 2018. No dia 24 daquele mês, policiais prenderam Honda temporariamente. Na mesma oportunidade, também foram cumpridos mandados de busca e apreensão na casa dele e na residência do ex-diretor-geral do órgão, Léo Carlos Cruz.
O dono da Cooperbras, o empresário Ronaldo de Oliveira, também é investigado na operação Trickster. De acordo com as apurações, ele comanda cooperativas e empresas que possuem sete contratos com o Governo do Distrito Federal (GDF). Somados, apenas quatro alcançam a cifra de R$ 36.051.890,36. Os convênios envolvem a prestação de serviços no ramo de transporte escolar em diversas cidades do DF.
Fraude em várias frentes
A ação das empresas de Ronaldo Oliveira é apenas um dos braços investigados na Operação Trickster, a qual culminou na prisão de 34 pessoas envolvidas na fraude bilionária que lesou os cofres do DFTrans. Segundo as apurações da Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) e do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), um mesmo cartão de vale-transporte chegou a ser utilizado 60 vezes, em apenas uma linha, em um intervalo de oito segundos.
O grupo, supostamente chefiado pelo auditor da Secretaria de Mobilidade Pedro Jorge Brasil, preso pela segunda vez, teria desviado mais de R$ 1 bilhão do sistema de bilhetagem do Distrito Federal. Boa parte do dinheiro, acreditam os investigadores, foi aplicada no mercado imobiliário.
O esquema funcionava desde 2014, destacou a PCDF, quando o servidor estava lotado no DFTrans. A quadrilha descarregava os créditos de cartões de vale-transporte nos validadores de ônibus, de forma sequencial e em linhas distintas. Tudo era feito com empresas de fachada e trabalhadores fantasmas, de acordo com as apurações policiais.
O outro lado
O Metrópoles procurou o DFtrans para falar sobre as declarações à Corf do ex-funcionário que teria encontrado os malotes de dinheiro. Por meio de nota, a autarquia ressaltou: “todos os depoimentos foram prestados no âmbito da Operação Trickster, deflagrada pela Polícia Civil, e, portanto, por serem sigilosos, não são do conhecimento desta autarquia”.
O DFTrans garantiu, ainda, que todos os processos administrativos abertos para apurar desvios de conduta de servidores públicos são sigilosos e encaminhados à Controladoria-Geral do Distrito Federal. METRÓPOLES