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POLÍCIA - 10/09/2020

Operação Inventário: Áudios mostram que advogados tentaram ocultar provas de crimes

Operação Inventário: Áudios mostram que advogados tentaram ocultar provas de crimes

Áudios obtidos pelo Grupo de Apoio Especial de Combate às Organizações Criminosas (Gaeco) apontam que alvos da Operação Inventário, deflagrada pelo Ministério Público da Bahia (MP-BA) nesta sexta-feira (10), tentaram esconder provas dos crimes. A ação apura fraudes em processos na 11ª Vara de Família, Sucessões, Órfãos, Interditos, Ausentes da Comarca de Salvador/BA.

Três pessoas foram presas nesta manhã: o advogado João Novaes, Marco Aurélio Fortuna Dórea e o servidor do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA), Carlos Alberto Aragão. Também são investigados os advogados Yuri Rodrigues da Cunha, Vilson Marcos Matias dos Santos e Cristiano Manoel de Almeida Gonzales, além de Lúcio Flávio Duarte de Souza, apontado como falsificador de documentos da organização criminosa. 

 

Uma transcrição de áudios trocados entre Novaes e Dórea em 9 de setembro do ano passado mostra a preocupação dos dois com uma possível descoberta do esquema. Novaes demonstra contrariedade com atos de Flávio e chega a xingá-lo. A conversa, que consta na decisão que autorizou a operação, obtida pelo Bahia Notícias, indica que o falsificador estaria usando outro nome em um processo no qual o grupo atuaria. 

 

“Marco Dorea [09/09/2019 às 09:42]: Pra isso aí, João, a gente vai ter que sentar para ver esse negócio, viu, velho. Aquele negócio de todo mundo peticionando acabou dando nisso aí, oh. Para não dar confusão.

João Novaes [09/09/2019 às 09:44]: Tudo isso foi alocado pelo Flávio, aquele vagabundo, entendeu? Ele vai se f... Eu vou apontar que ele se dizia Pedro dos Santos, quem vai tomar no c.... é ele.”

 

Ainda segundo o MP, Lúcio já foi denunciado em outras ocasiões por usar documento falso para tentar sacar créditos de precatório judicial.  Os investigados também se queixam de uma quantidade de petições exacerbada em determinado processo, sem alinhamento entre os integrantes da suposta quadrilha. Os dois direcionam a crítica principalmente para Cristiano, caracterizado como pessoa que age de maneira atrapalhada, sem consultar os demais membros do grupo. 

 

“Marco Dorea [09/09/2019 às 09:45]: Essa porra aí tá mais direcionada para o Banco do Brasil, mas a gente tem que... Vou ter que ir lá hoje falar com nosso amigo para ele segurar, soltar esse ofício para o Banco do Brasil, para o Banco do Brasil fazer a informação, aí a gente aguarda, entendeu? Se não depois vai ter que dar um fim. É muita petição, porra, não podia peticionar sem tá todo mundo alinhado, não.

Marco Dorea [09/09/2019 às 09:46] Esse Vilson aqui, para ele dá uma olhada, mas a gente vai ter que sentar com esse Cristiano e ver como é que resolve isso aí.”

 

Vilson Matias e Cristiano são apontados pelo MP como substitutos de Yuri Rodrigues na atuação nos processos fraudulentos. Em outro diálogo, desta vez entre Novaes e Flávio, o advogado demonstra que o processo “vai dar uma merda” e que não quer ser envolvido na situação. Queixa-se de que não consegue contato com o falsificador e diz que irá atrás dele onde ele estiver. 

 

“João Novaes [24/07/2019 às 11:39] Oh, Flávio, bom dia. João Novais. Você não atende ligação, mas tudo bem. Esse processo que tá lá que Vilson e o outro menino tão peticionando, eu quero conversar com você. Isso vai dar uma merda e eu não quero que sobre para mim, que eu não tenho nada a ver com isso, viu? Eu quero que você dê um pulo aqui no meu escritório, porque se você não me procurar no meu escritório eu vou atrás de você, onde você tiver, tô lhe avisando.”

 

Flávio, então, responde dizendo que não tem medo de ameaças. 

 

“Flávio [24/07/2019 às 11:46] Doutor, bom dia, veja só, se você quiser o endereço de minha casa eu lhe dou, eu não tenho que tá escondendo nada de ninguém, certo? E se eu não lhe atendi, foi porque eu estava ocupado, como estou. Mas a gente conversa, sem problema nenhum. E eu não tenho medo de ameaças nenhum, de ninguém.

João Novaes [24/07/2019 às 11:46] Você pegou o dinheiro para fazer a documentação, cadê a documentação, Flávio? Cadê a documentação? Que você pediu dinheiro aqui para eu lhe dar, para você fazer a documentação que atrasei com sete dias, com três dias, sei lá. Cadê essa documentação? E outra coisa, viu, eu não vou falar nada não. O silêncio é a melhor coisa que tem.

João Novaes [14/08/2019 às 12:19] Flávio, bom dia. Eu tô agendando com Vilson e Marco Dórea, agora às 15h lá no escritório dele uma reunião e sugeri a ele e ele concordou da sua presença, entendeu? Se você puder ir lá... Você sabe onde é o escritório de Vilson? Lá na Paralela, no final da Paralela, senão eu mando o endereço para você, que ele me mandou aqui, me comunique aí, um abraço.”

 

Uma outra gravação mostra Carlos Aragão, servidor do TJ, orientando sobre o que Novaes deveria fazer para obter a liberação de R$ 600 mil bloqueados judicialmente em um processo. 

 

“Carlos Aragão [31/07/2019 às 14:19]: Tudo bom, João? Eu tava olhando aquele processo de Dona Jacira, né? E chegou com cabra aqui, o Nilson aqui que tá rodeando, né? Aí ele me chamou para conversar aqui, eu tava saindo e ele me pegou... E mostrou que tem um dinheiro bloqueado, seiscentos mil bloqueado, que é o restante daquele mil e duzentos que a gente fez, lembra? Que a gente mandou bloquear mil e duzentos, só que só achou setecentos, na época e foi feito só o bloqueio de setecentos. Só que a ordem ficou, com a ordem ficando, o que acontece? O dinheiro apareceu e ficou bloqueado. Aí, qual era o comando agora? O comando agora é fazer a transferência do dinheiro que está bloqueado para o Banco do Brasil, fórum, ok?

Carlos Aragão [31/07/2019 às 14:20]: Aí o que ocorre, o dinheiro está bloqueado desde aquele tempo e a gente não... não deu tempo.... Aí o que é que eu tô pensando aqui, por isso que eu tô devagarzinho, bom, o dinheiro tá bloqueado a disposição do juízo, só não está transferido, ok? Então, o Nilson [Vilson] disse que.... Orientei ele, né? Faça uma petição pedindo ao juiz que faça a transferência dos seiscentos mil para essa conta aqui do Banco do Brasil e a partir daí a gente vai ver qual o caminho que vai ser seguido. Aí ele.... Eu perguntei, venha cá rapaz, quem tá nesse processo? Aí ele: Ah, porque João tá também, mas João se acerta lá com o cliente dele e eu acerto com você. Eu digo, oh negão primeiro vamos ver se a gente consegue a transferência desse dinheiro para cá para depois a gente começar a caminhar, tá bom? Aí eu saí e deixei ele lá resolvendo o que ele ia fazer, mas tô te dando um alô para ver qual a ideia que você tem aí.

João Novaes [31/07/2019 às 14:22]: Cuidado com esse Vilson aí, esse Vilson aí tá metido com doutora Otília aí, deu um problema do tamanho do mundo. Ele peticionando nesse processo, seria bom Cristiano peticionar junto com o menino que Dórea botou, seria bom os dois peticionarem nesse processo pedindo para o dinheiro vir, porque aí é o seguinte, mesmo o dinheiro estando lá se tiver o ID aí, dá o comando por lá que deposita na conta de quem indicar, se já tiver o ID, pergunta a Heliana se já tem o ID.”

 

MOVIMENTAÇÕES BANCÁRIAS FRAUDULENTAS
Na decisão que autorizou a operação, dada pelo juiz Vicente Reis Santana Filho, da Vara dos Feitos Relativos a Delitos Praticados por Organização Criminosa, o Gaeco aponta movimentações bancárias que trazem indícios de que a quadrilha praticava lavagem de dinheiro através do pagamento de alvarás. O valor era diluído entre os supostos integrantes do grupo, a fim de ocultar a origem do dinheiro, incorporando-os aos seus patrimônios. 

 

Segundo a investigação, aproximadamente 25% dos créditos verificados nas contas de Carlos Aragão não correspondem à sua atividade profissional declarada. O Gaeco considera que a movimentação financeira ocorrida nas contas de João Carlos Santos Novaes e Rodrigo Pinheiro Schettini é incompatível com os rendimentos declarados pelos mesmos

 

Sobre Yuri Rodrigues da Cunha, os investigadores verificaram que uma única movimentação ocorrida em 4 de junho de 2018 correspondeu a 60% de tudo que foi creditado em seu favor nos 72 meses analisados, sendo que, naquele dia, Yuri recebeu um crédito via resgate de depósito judicial no valor de R$ 679.063,55. Dois dias depois, ele transferiu 57% desse valor para Novaes e 40% para Dórea.

 

No caso de Fernando José de Alencar, foi encontrada uma única movimentação ocorrida em 16 de outubro de 2018, correspondente a 67% de tudo que foi creditado na conta dele nos 72 meses analisados. Naquele mesmo dia, segundo o MP-BA, Alencar recebeu um depósito de R$ 379 mil, realizado em espécie na cidade de Garanhuns/PE, por meio de Rozilene Belo da Silva. Menos de dez dias depois, em 25 de outubro, ele sacou R$ 364 mil. Com informaçoes por Bahia Notícias.


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